“70% dos autores tinham compromisso com a indústria farmacêutica”, diz o psicanalista Christian Dunker sobre o manual das doenças mentais, no Provoca
Nesta terça-feira (26/11), no Provoca, Marcelo Tas conversa com o psicanalista Christian Dunker, autor de 14 livros. No bate-papo, ele fala sobre a importância de escutar; o excesso de medicação e diagnóstico; a crise da saúda mental e muito mais. Vai ao ar na TV Cultura, às 22h.
Na edição, Dunker explica sobre a importância da escuta: “Escutar implica você se despir, você encontrar a sua vulnerabilidade para sair de si e falar a língua do outro (...) o segundo passo é que o outro não é um ponto de vista, o outro não é um ponto geométrico. O outro tem nele coisas que ele desconhece, obscuridades, monstros, fadas (...) aquilo tem que te afetar, mas onde? Na sua cognição, seu juízo? Não, tem que te afetar mais além do seu eu, mais além do seu julgamento, do que você acha. Esta afetação que você recebe do que o outro disse, mais além do que ele queria dizer, exige um último trabalho que é se escutar e criar”, explica.
Em outro momento da conversa, Tas pergunta: “A gente vive hoje uma situação que chamamos de quê? Epidemia de saúde mental?” “É uma crise porque, justamente, esse modelo não entregou o que prometia (...) Prozac, a pílula da felicidade, vamos despejar antidepressivo para todo mundo (...) ajuda, a gente vai indo um pouco como a psicoterapia, mas a pessoa não adquire asas, nem vira a mulher-maravilha. ‘Onde está o erro dessa promessa? É buscar a felicidade?’, questiona Marcelo Tas. “Faltou muito o desenvolvimento de uma cultura do cuidado do si. Faça esporte, açúcar não, acaba com o sal, vai à academia (...) e quanto à alma? Como você cuida de você mesmo? Observar seus sonhos, ver as coisas de perto e de longe, olhar de frente para os seus fantasmas, decompor ideias (...) decompor suas cadeias de pensamento, olhar as estrelas, sentir-se pequeno, olhar as formigas, sentir-se grande”.
O psicanalista responde à pergunta de um internauta sobre o aumento exagerado do número de casos de TDAH e autismo. “Há um problema real em torno do excesso de medicação, excesso de diagnóstico, autodiagnóstico a rodo na internet (...) a gente faz uma pesquisa na USP, no Laboratório de Teoria Social, Filosofia e Psicanálise, que é examinar como foi feito o código das doenças mentais vigente hoje no mundo, que é o DSM-5. Como foi feito? 70% dos autores tinham compromisso com a indústria farmacêutica. Quinhentos novos diagnósticos em menos de 50 anos. Não existe isso na medicina (...) diagnósticos suspeitos como o TDAH, como o Transtorno Opositivo Desafiador, como o Transtorno Disfórico Menstrual, que você vai dizer: envolve sofrimento? Envolve, mas isso é um transtorno? Como é que isso vai ser apresentado para as pessoas? Ou seja, a gente defende mais saúde mental, mais preocupação com o sofrimento das pessoas e menos pasteurização, menos empreitamento do sofrimento alheio”, diz.