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De janeiro a junho deste ano, 1.805 famílias negaram a doação de órgãos de seus parentes, de acordo com dados da Associação Brasileira de Transplante de Órgãos (ABTO). O ato de doar pode transformar e dar mais uma oportunidade de vida a milhares de pessoas que precisam de transplantes no Brasil. Com reportagens de Caco Barcellos, Nathalia Tavolieri, Júlio Molica e Letícia Marotta, o ‘Profissão Repórter’ desta terça-feira, dia 8, acompanha a espera nas filas, a esperança e os gargalos nos processos de doação de órgãos no Brasil. Há 23 anos, a enfermeira Lisiane Paiva conversa com pessoas que acabaram de perder seus familiares de maneira trágica e pergunta se elas concordariam em doar as córneas do parente falecido. "A família entra, diz bom dia e a gente não retribui. Quando a família senta, a gente olha pra ela e diz: 'eu não retribuí o seu bom dia porque talvez hoje seja o pior dia da sua vida'. Ali ela já se sente acolhida e respeitada", afirma Lisiane. A enfermeira tem o cuidado de adotar algumas estratégias ao conversar com os parentes enlutados, como não cruzar braços ou pernas, ficar curvada em direção à família e ajustar a altura da cadeira para se posicionar na mesma altura dos interlocutores. O irmão de um homem que foi atropelado por um ônibus em Fortaleza no último dia 26 de setembro aceitou doar as suas córneas. "Triste eu estou, mas Deus está me dando força. O órgão dele vai salvar outras vidas. Isso não se compra", disse. Em casos de morte por parada cardíaca, o sangue para de circular entre os órgãos, o que impossibilita o transplante de coração, pulmão, fígado e rins. No entanto, as córneas, que não possuem vasos sanguíneos, podem ser doadas. A reportagem de Júlio Molica e Letícia Marotta mostra que, por mais que se tenha expressado em vida o desejo de doar órgãos, a decisão final cabe aos familiares e esse é o principal gargalo para expansão dos transplantes no Brasil. Há dois meses, Lorena Freitas, de oito anos, recebeu um transplante de coração no Instituto do Coração (Incor), em São Paulo. "Depois de cinco anos e dois meses, o meu sim finalmente chegou!", celebra a criança. A repórter Nathalia Tavolieri conheceu Lorena em março de 2021, quando ela tinha apenas quatro anos de idade. Na época, o número de transplantes de órgãos havia caído em decorrência da pandemia. Desde então, Nathalia vem registrando os principais momentos da jornada de Lorena por um coração novo. Com uma rotina cheia de consultas e medicações diárias, Lorena conseguia esperar por um transplante em casa, mas em maio deste ano seu estado de saúde se agravou e a menina foi internada. Natural de Arapiraca (AL), Bárbara Freiras, mãe de Lorena, se mudou para São Paulo em 2019 com o marido e a filha em busca de tratamento. "Quando soube que minha filha receberia o transplante de coração, só consegui sentir gratidão à família doadora. É preciso muita bondade, muita empatia e amor ao próximo para ser capaz de um ato tão bonito, em um momento de tanta dor. Serei eternamente grata a essa família que nem conhecemos!", diz Bárbara. No Brasil, a espera por um rim é a maior entre os pacientes que necessitam da doação de um órgão sólido, como fígado, pulmão, coração e pâncreas, segundo a Associação Brasileira de Transplantes de Órgãos (ABTO). Janaína é filha de Sérgio, que esperava na lista de transplantes por um rim. Assim como Ana Célia, irmã de Rosa, que precisava de uma doação. E Maria Aparecida, esposa de Vantuil, também paciente renal. Mas Janaína não doou o rim para o pai Sérgio, nem Rosa para a irmã Ana e nem Vantuil para esposa Aparecida. Os familiares, incompatíveis, esperaram por cerca de dois anos em uma lista de mais de 35 mil pessoas. Em agosto deste ano, uma equipe médica da Santa Casa de Juiz de Fora, em Minas Gerais, propôs um procedimento inédito no Brasil. Pela primeira vez, três famílias se combinaram em uma doação chamada de "pareada". Janaína doou para Aparecida, esposa de Vantuil. Ele, por sua vez, doou para Ana Célia, irmã de Rosa que doou para Sérgio, pai de Janaína. Os familiares descobriram ser compatíveis com os outros pacientes e a combinação entre as famílias gerou uma "troca de doações”. O procedimento, já em prática em outros países e trazido ao Brasil por um estudo do Hospital das Clínicas em São Paulo, só havia sido realizado entre duas duplas. Os médicos acreditam que a estratégia inédita tem potencial de reduzir a lista de espera. "Oitenta e cinco por cento das doações de órgãos ainda acontecem por meio de doadores falecidos. A doação entre vivos é uma parte muito menor. Mas, se posta em prática no país inteiro, a doação pareada teria potencial para reduzir em 20% a lista dos que esperam", diz Juliana Bastos, uma das nefrologistas à frente do estudo em Juiz de Fora, ao repórter Caco Barcellos. O Profissão Repórter desta terça-feira, dia 08, vai ao ar logo após o especial ‘Falas da Vida’. |
‘Profissão Repórter’ acompanha os processos e obstáculos para a doação de órgãos no Brasil
Reviewed by Pablo
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outubro 08, 2024
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